Retrospectiva 2024: Do meio ambiente à política... | VEJA

Nunca houve, na história da civilização industrial, ou pelo menos desde que ferramentas científicas começaram a medir com acuidade as transformações climáticas, um ano como o de 2024. Ele terá sido o mais quente desde sempre — e a elevação das temperaturas, que se sucede com incômoda frequência, sugere o efeito daninho da ação do ser humano, e não apenas resultado de fenômenos naturais como o El Niño. Nos últimos doze meses, em quase todo o mundo houve inundações e secas severas e inesperadas. No Brasil, os dramas das enchentes no Rio Grande do Sul e do fogo no Pantanal e na Amazônia foram marcos terríveis de inépcia e irresponsabilidade.

Pode-se dizer que os raios e trovoadas de uma temporada de natureza rebelde, alimentada pela ganância da humanidade, são metáforas de muitos dos principais eventos que, de janeiro a dezembro, nos deixaram em estado de alerta, desnorteados e assustados com retrocessos inaceitáveis. Vive-se, no cotidiano ambiental e da sociedade, uma era de extremos. A revelação do plano do vergonhoso movimento golpista de 8 de janeiro de 2023, que incluía o assassinato do presidente eleito, Lula, do vice Geraldo Alckmin e do juiz Alexandre de Moraes, do STF, é indício da estúpida intenção de levar o Brasil para trás, em triste nostalgia pelo tempo da ditadura, o regime que encarcerou e matou o ex-deputado Rubens Paiva, em 1971, personagem central do premiado filme Ainda Estou Aqui, de Walter Salles. O sucesso do longa-metragem, visto por mais de 2 milhões de pessoas no país, entre lágrimas e aplausos, é uma resposta contra o retrocesso extremado. É preocupante, também, o recuo do ponto de vista da condução da economia brasileira, com desleixo em relação ao corte de gastos e ao controle das contas públicas, postura pela qual o populismo alimentado por Lula e pelo PT caminha para o tempo em que ao Estado tudo cabia — em evidentedesconexão com medidas que realmente funcionam para fazer andar a livre-­iniciativa e tirar o povo da inaceitável miséria.

Há respiração presa diante do que será, a partir de janeiro, a segunda gestão de Donald Trump, eleito em novembro ao derrotar, com larga margem, a candidata democrata, Kamala Harris, numa campanha em que sofreu um atentado. Temem-se o protecionismo trumpista e a condução de seu governo em temas centrais como o da saúde, ao nomear como secretário o negacionista de vacinas Robert F. Kennedy Jr., e, sublinhe-se, especialmente o do controle ambiental, ao desdenhar de acordos internacionais sem os quais o planeta corre mais perigo. Tudo isso aumenta a torcida para que as ideias obtusas e o radicalismo em todos os aspectos — na ecologia e na ideologia — aos poucos percam força e tração em 2025, em nome da sensatez e da paz. Não há outra saída de esperança para o futuro.


Publicado em VEJA de dezembro de 2024, edição nº 2924